Trabalho internacional apontou características do quadro e da contaminação no surto atual da doença
Organização Mundial da Saúde (OMS) tendo declarou emergência de saúde internacional na última semana
O novo estudo, porém, assim como outros publicados recentemente, encontrou o DNA do monkeypox
Para chegar à conclusão apresentada no estudo, os responsáveis analisaram um total de 528 diagnósticos
Enquanto os casos de varíola dos macacos avançam no mundo, com a Organização Mundial da Saúde (OMS) tendo declarado emergência de saúde internacional na última semana, os cientistas buscam entender o perfil da doença neste novo surto, que pela primeira vez se dissemina pelo planeta e afeta regiões de fora do continente africano. Um novo estudo, conduzido por pesquisadores de diversas nações e publicado na revista científica New England Journal of Medicine, aponta uma das características da infecção que tem chamado atenção dos especialistas: 95% dos casos analisados são suspeitos de transmissão durante a relação sexual.
Antes do surto atual, sabia-se que o vírus era transmitido por contato prolongado de pele com pele, especialmente com as lesões cutâneas causadas pela doença, mas não havia registros de disseminação tão recorrente entre humanos e em episódio associados ao sexo. O novo estudo, porém, assim como outros publicados recentemente, encontrou o DNA do monkeypox – vírus causador da varíola dos macacos – no sêmen em 29 de 32 homens que tiveram a amostra analisada.
— O teste para identificar a doença é feito pelo PCR e pode ser realizado em diversas amostras, como pele, saliva e o sêmen. Ele te diz se naquela amostra há sequências de material genético de determinado agente infeccioso, como fazemos para identificar a Covid-19 hoje. Só que você pode ter um fragmento de DNA ali que não signifique que o vírus está ativo sendo transmitido. Pode ser apenas um pedaço, ou estar inativado — explica o médico geneticista Salmo Raskin, diretor do laboratório Genetika, em Curitiba.
Por isso, não há confirmação de que a presença do vírus no local é capaz de provocar uma infecção, o que caracterizaria a varíola dos macacos como uma infecção sexualmente transmissível (IST). Há, por exemplo, a possibilidade de a ampla contaminação ligada a relações sexuais acontecer apenas pelo momento íntimo favorecer o contato da pele com pele, que já se sabe ser um meio de contaminação.
No entanto, Raskin diz que o número de evidências crescentes que têm encontrado o vírus no sêmen e outras características da disseminação o levam a acreditar que eventualmente essa forma de contaminação será sim comprovada. Para isso, é preciso ainda que os cientistas identifiquem se o microrganismo presente ali consegue se replicar.
— É preciso fazer uma técnica chamada de cultura viral, em que se analisa essas amostras para descobrir se o vírus presente ali está se replicando ou não, o que indicaria se ali ele consegue transmitir ou não. Eu acredito que os estudos indicam que ele pode estar se dividindo sim, mas ainda é preciso de confirmação. Isso de fato levaria o vírus a ser transmitido pelo sexo, porém essa não seria a única forma de contaminação. Nós sabemos que o contato físico com as lesões pode levar à infecção, seja em qual lugar do corpo for — afirma o geneticista.
Para chegar à conclusão apresentada no estudo, os responsáveis analisaram um total de 528 diagnósticos, em 16 países, detectados entre abril e junho deste ano. Além da suspeita em relação ao sexo, eles constataram que as erupções cutâneas – sintoma mais característico da doença – acometeu 95% dos pacientes. Destes, a maioria (64%) apresentou menos de dez lesões ao todo, e 73% dos relatos foram na região do ânus e da genitália.
A avaliação dos cientistas também constatou que, de 377 pessoas testadas, 109 (29%) apresentaram ISTs concomitantes à contaminação pelo vírus monkeypox. Além disso, embora as autoridades de saúde, como a OMS, deixem claro que todos podem ser infectados e alertem para o cuidado com o estigma, o estudo mostrou que a maioria dos pacientes são homens gays, bissexuais ou que fazem sexo com outro homens – 98% da amostra. A média de idade dos infectados foi de 38 anos e 41% tinham um diagnóstico de HIV.
— Nós precisamos falar sobre o perfil dos infectados para transmitir as informações de maneira clara para que as pessoas consideradas de maior risco se protejam, mas também precisamos nos atentar para não criar uma estigmatização com determinados grupos, já que todos podem ser contaminados — defende Raskin.
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